As principais arquiteturas de telecomunicações: Enterprise Domain – Parte 2
Gustavo Bunger, fundador da AC Talks
Dando prosseguimento ao artigo anterior, continuamos a mostrar as capacidades relacionadas à gestão empresarial, que tratam das capacidades e funções que mantém as próprias organizações funcionando.
Gestão da conformidade e regulamentação
A criação e o fechamento de uma empresa, bem como todo o ciclo entre estes dois marcos é absolutamente regido por legislações. As atividades contábeis e o atendimento às leis das esferas internacionais, federais, estaduais e municipais são tantas que se destacam com uma capacidade básica das organizações. É justamente para conseguir representar todo esse conjunto de atendimento às normas, que existe a capacidade de conformidade e regulamentação.
Entre o final da década de 90 e o início dos anos 2000, tivemos um incidente financeiro nefasto nos EUA que gerou um impacto global: o escândalo da Enron, uma empresa originalmente dedicada o mercado de energia e que se expandiu em outras indústrias, como telecomunicações de banda larga. O escândalo emergiu quando os balanços chamaram a atenção das comissões financeiras por conta dos expressivos lucros, muito acima da média de outras grandes corporações da época. Após investigações, descobriu-se que um esquema monumental de falsificação de balanços, manobras documentais, contábeis e em 2002 surgiu a Lei Sarbanes-Oxley, um marco legal que transformou o mercado mundial para empresas com ações nas bolsas de valores. Você pode obter mais informações sobre esse escândalo no link https://www.investopedia.com/updates/enron-scandal-summary/.
O surgimento dessa lei marca o início da era moderna de “compliance” ou conformidade em português. Com a necessidade das empresas em se adequar à nova legislação, surgiram departamentos inteiros da chamada governança corporativa para garantir o atendimento a cada recomendação e artigos da lei, e por meio de auditorias internas e externas, esses departamentos certificavam (e continuam a certificar até hoje) que as organizações estavam com seus processos e finanças totalmente saudáveis e dentro da legalidade.
Serviços administrativos
Os serviços administrativos cobrem diversos aspectos que não são tão específicos para se encaixarem nas demais capacidades, mas não menos importantes no que se refere à operação da organização.
De forma não exaustiva, algumas capacidades importantes são:
• Jurídico: Normalmente encontrado como um departamento em empresas, reunindo advogados e especialistas de diversos tipos de assuntos legais (direito administrativo, tributário, civil, etc.) para defender os interesses da organização perante o poder judiciário.
• Relações institucionais: Muito mais do que uma área de publicidade para promoções de produtos, cuida da imagem da empresa perante a sociedade, atuando fortemente hoje em dia na curadoria das mídias sociais, resposta à incidentes, relação da empresa com governos, entidades e outras organizações e propaganda da marca.
• Gestão de projetos: Ao engendrar produtos, as organizações precisam planejar e controlar seu desenvolvimento, implantação e ciclo de vida. As empresas podem criar programas (conjuntos de projetos) que concatenados habilitam novos produtos, serviços e mantém a empresa à frente dentre seus concorrentes.
Gestão de recursos humanos
Organizações são criadas, geridas e evoluídas por pessoas. Gerir esse capital humano, estabelecer o que a organização recebe e devolve a elas é a razão fundamental da existência desta capacidade. Muito além das primordiais análises do tipo “tempos e movimentos”, as áreas de RH hoje atuam com uma visão de desenvolvimento abrangente dos colaboradores, criando planos de carreira, benefícios, retendo talentos e permitindo que essas pessoas possam trabalhar em equilíbrio entre a vida profissional e pessoal.
Algumas funções importantes desta capacidade:
• Gestão do cadastro de colaboradores
• Reconhecimento
• Gestão de benefícios
• Diversidade corporativa
• Treinamentos corporativos
• Relações trabalhistas
• Folha de pagamento
• Planejamento de carreira
• Comunicação interna
• Gestão de terceiros
Gestão da cadeia de suprimentos
Vimos que dentro do domínio de gestão empresarial, passamos por capacidades que lidam diretamente com pessoas e processos, mas e os recursos que ambos utilizam? Como as empresas de telefonia por exemplo adquirem cabos e equipamentos e os transportam às localidades remotas? Como lidam com a devolução de equipamentos quando os clientes desejam cancelar suas assinaturas? Como adquirem suprimentos no mercado garantindo um preço de aquisição que mantenha o preço de um produto ou serviço atrativo para seus clientes?
Esses temas relacionados a recursos e insumos são tratados na capacidade de gestão da cadeia de suprimentos. Dentre suas funções intrínsecas, a logística se destaca como o conjunto de processos e métodos que permite entregar recursos (materiais) específicos em determinados locais, no tempo necessário.
Imagine um serviço de instalação de fibra óptica para um cliente em sua casa; para esse serviço ocorrer, são necessários diversos insumos:
• Ferramentas
• Cabos ópticos
• ONTs (CPE)
• Equipamentos de teste
Sem algum desses insumos, a força de trabalho (prestadoras de serviço de rede) não conseguirá efetuar os lançamentos de cabos, prender conectores, instalar os terminais na casa do cliente e testá-los por exemplo. Há que se ter um conjunto de processos que garanta que a companhia telefônica possa ter esses materiais em estoque ou conforme a demanda por serviços de instalação seja atendida. É pela logística que essa cadeia de suprimentos (daí o nome da capacidade) é garantida.
A gestão de transporte é outra capacidade importantíssima para planejar e controlar como os materiais são expedidos de e para armazéns de outras organizações. Muitas vezes é necessária a contratação de empresas transportadoras especializadas em materiais sofisticados e sensíveis como os empregados nas redes de telecomunicações.
O planejamento dos estoques, consumo e aquisições de materiais faz parte da gestão de aquisições, normalmente materializada nas empresas por meio de uma área responsável por prospectar fornecedores, cotar preços e prazos negociando as melhores margens temporais e financeiras.
Gestão do conhecimento
Conhecimento é o resultado de um processamento de informações complexo e com subjetividades. O histórico institucional, as experiências na execução de processos, os saberes, as práticas, as invenções e colaborações que surgem ao longo da operação de uma organização formam um conhecimento que precisa ser não só retido, como melhorado e reutilizado, e dão a empresa sua identidade, “seu jeito” de se relacionar com seus colaboradores, parceiros e clientes.
Não é possível gerir o conhecimento, mas sim fomentá-lo e registrá-lo. O termo gestão junto ao termo conhecimento limita bastante o significado de ambos, mas foi preciso empregá-los para modelar no TAM como uma capacidade importante.
São três as capacidades principais dentro de gestão do conhecimento:
• Gestão de conteúdos: As informações que a organização disponibiliza em suas Intranets ou portais externos formam conhecimento que será absorvido por diferentes audiências. Faz-se necessária, portanto, a curadoria desses conteúdos, garantindo o envio da mensagem correta aos destinatários deles.
• Gestão da colaboração: O conhecimento institucional é formado pela interação entre os colaboradores de uma empresa durante a execução de seus vários processos. Existem na atualidade inclusive, dezenas de ferramentas que mantém repositórios de documentos, atas de reunião, gravações de vídeoconferências entre outros artefatos que retém dados, informações e conhecimento corporativo.
• Gestão da propriedade intelectual: Todo o conhecimento gerado pela organização cria uma identidade e uma marca que permite reconhecer como a empresa se porta internamente e perante o mercado. Em vários casos, a inovação propicia a criação de novos produtos e serviços, que são então patenteados e explorados comercialmente. A curadoria da marca e seu uso, bem como a gestão de patentes são funções oriundas da propriedade intelectual, ou seja, no campo das ideias e representações.
Com este artigo fechamos a série sobre arquitetura e telecomunicações, dando uma visão geral de diversos domínios, capacidades e funções que essa indústria requer nos seu dia a dia organizacional. Acompanhe os próximos artigos e até lá!
Gustavo Bunger é graduado em análise de sistemas pela Faculdade Anhanguera de Belo Horizonte e pós-graduado em novas tecnologias da informação pela UFRJ- Universidade Federal do Rio de Janeiro. Possui mais de 20 anos de experiência em TIC, atuando em educação, operações de sistemas, gestão de serviços e arquitetura corporativa. É fundador da iniciativa AC Talks, que visa divulgar temas de arquitetura por meio de palestras.