Como o plano brasileiro de IA pode redefinir a soberania tecnológica e liderar a América Latina
Prof.ª e Dra. Alessandra Montini
O PBIA – Plano Brasileiro de Inteligência Artificial 2024-2028, lançado na 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, promete ser um divisor de águas para o futuro tecnológico do Brasil. Com um investimento previsto de R$ 23 bilhões em quatro anos, o plano não é apenas um projeto técnico, mas uma verdadeira declaração de independência digital. O objetivo é transformar o Brasil em uma referência mundial em inovação, com um uso da inteligência artificial que vá além do setor público, refletindo a realidade local e, acima de tudo, respeitando a soberania nacional.
Esse plano não é só sobre inovação; é sobre autonomia. Chega de importar soluções prontas de países que ditam suas próprias regras. Estamos falando de construir uma IA que seja genuinamente brasileira, que respeite nossos desafios e valores, que nos permita dizer “não” à submissão tecnológica às potências estrangeiras. O Brasil precisa de uma infraestrutura computacional própria, de pesquisa local robusta, e de parcerias que impulsionem a inovação nacional, mas com os interesses brasileiros no centro da mesa. Não é um capricho; é uma questão de sobrevivência.
Este é um momento único para o Brasil, que precisa decidir se quer liderar ou ser liderado na América Latina. Temos a oportunidade de nos tornar um polo regional de inovação em IA, algo que vá além do protagonismo econômico e atinja o campo estratégico. Não é só sobre competir com EUA e China; é sobre criar um ecossistema que dialogue com a América Latina, que entenda nossas dores e proponha soluções que nos sirvam. Podemos — e devemos — usar essa liderança para construir uma aliança tecnológica na região, promovendo um desenvolvimento que reflita nossos interesses e valores comuns.
Mas sejamos claros: liderar vem com um peso. O Brasil não pode se dar ao luxo de apenas seguir tendências ou copiar modelos internacionais. Nossa responsabilidade é construir algo autêntico, que ajude a resolver nossos problemas e que se transforme em um farol para nossos vizinhos. Não podemos mais nos permitir ser apenas um mercado consumidor de tecnologias desenvolvidas lá fora. A hora de agir é agora.
O impacto do plano é imenso, e não só do ponto de vista econômico. Na agricultura, na saúde, na educação e na segurança pública, a IA promete transformações profundas. Mas o que está em jogo é muito maior: é a nossa capacidade de sermos donos do nosso próprio destino tecnológico. É ter uma IA que não seja uma caixa preta controlada por interesses externos, mas uma ferramenta construída com transparência e ética, que respeite a privacidade e os direitos dos cidadãos. Se falharmos, corremos o risco de trocar uma dependência por outra, perpetuando um ciclo de subordinação tecnológica que não faz jus ao nosso potencial.
O Brasil em busca de uma voz própria
O Brasil tem a chance de se posicionar como uma voz relevante no debate global sobre IA, mas para isso, é preciso ir além das intenções. Precisamos transformar o discurso de soberania em ações concretas, que passem pela capacitação da nossa força de trabalho, pelo desenvolvimento de tecnologias próprias e, principalmente, por uma governança que reflita os interesses do povo brasileiro. Não basta prometer uma IA soberana; é preciso garantir que ela seja construída de maneira justa, inclusiva e democrática.
A construção de uma IA soberana não é um caminho fácil, mas é um caminho necessário. O PBIA é um convite para que o Brasil assuma seu protagonismo tecnológico e deixe de ser um mero espectador na arena global. Precisamos de coragem para enfrentar os desafios e de um compromisso real com a ética e a transparência. Não se trata apenas de inovação, mas de uma escolha sobre o tipo de país que queremos ser. Queremos ser independentes, capazes de definir nossos próprios rumos, ou continuaremos a aceitar nosso lugar à margem das grandes potências?
O Brasil tem tudo para liderar essa transformação, mas o tempo para agir é agora. A IA soberana é mais do que um projeto; é uma necessidade estratégica, uma oportunidade única de reescrever nossa própria história tecnológica e, de quebra, inspirar toda uma região. É hora de o Brasil ser protagonista e mostrar ao mundo que a inovação também fala português.
Diretora do LABDATA-FIA, apaixonada por dados e pela arte de lecionar, Alessandra Montini tem muito orgulho de ter criado na FIA cinco laboratórios para as aulas de Big Data e inteligência Artificial. Possui mais de 20 anos de trajetória nas áreas de Data Mining, Big Data, Inteligência Artificial e Analytics.
Cientista de dados com carreira realizada na Universidade de São Paulo, Alessandra é graduada e mestra em estatística aplicada pelo IME-USP e doutora pela FEA-USP. Com muita dedicação, a profissional chegou ao cargo de professora e pesquisadora na FEA-USP, e já ganhou mais de 30 prêmios de excelência acadêmica pela FEA-USP e mais de 30 prêmios de excelência acadêmica como professora dos cursos de MBA da FIA. Orienta alunos de mestrado e de doutorado na FEA-USP. Membro do Conselho Curador da FIA, é coordenadora de grupos de pesquisa no CNPq, parecerista da FAPESP e colunista de grandes portais de tecnologia.