MVNO: Um mercado em expansão
As MVNOs – Mobile Virtual Network Operator ofertam serviços regionalizados e customizados, de forma mais rápida, utilizando a infraestrutura das operadoras de telecom, favorecendo a digitalização de pessoas e empresas, no campo ou na cidade.
Ariane Guerreiro, colaboradora da Infra News Telecom
As telecomunicações tiveram sua importância reforçada na pandemia, nos mais diferentes segmentos econômicos e sociais: relacionamentos, comércio, informação, saúde, transporte, educação, entre tantas atividades. O setor tende a ser impulsionado ainda mais com a chegada do 5G – cujo leilão foi realizado em novembro de 2021 –, abrindo novas perspectivas, especialmente para serviços segmentados.
É aí que entram as MVNOs – Mobile Virtual Network Operator, que têm a oportunidade de oferecer serviços regionalizados e customizados, de forma mais rápida, utilizando a estrutura de operadoras já consolidadas no mercado, favorecendo a digitalização de pessoas e empresas, no campo ou na cidade. Trata-se de um mercado de grande potencial, que pode ser conquistado por meio de parcerias com ISPs – provedores de serviços de Internet e operadoras regionais para a oferta de serviços 5G.
De acordo com a Anatel, até outubro último, 122 empresas estavam credenciadas, com contratos vigentes, e dez autorizadas a atuar nesse tipo de serviço. Esse número vem crescendo de forma significativa desde 2015, quanto só uma empresa estava credenciada, passando para 20 em 2019 e para 79, em 2020.
Carlos Araújo, diretor de novos negócios da Claro, observa bem esse movimento, que vem trazendo ao mercado nomes bastante reconhecidos em outros segmentos comerciais. “O MVNO vem se expandindo ao longo dos anos; vemos inúmeras marcas sendo lançadas, a exemplo do Magazine Luiza, um gigante do varejo nacional, que firmou parceria com a Claro”, destaca.
A Claro tem presença nacional e é uma das operadoras que explora ambos os modelos regulatórios, mas com maior foco no credenciado. “Atuamos de forma bastante estruturada e com visão de longo prazo. MVNO é parte de nossa estratégia de transformação, expansão e crescimento de receitas alternativas”, explica Araújo.
Paulo Humberto Gouvea, diretor de soluções corporativas da TIM, também reconhece esse potencial. A empresa mantém conversas avançadas com outras potenciais operadoras virtuais constantemente. “Acompanhamos esse mercado desde o seu início. As MVNOs não representam uma concorrência pelo usuário final, mas um mercado promissor e uma grande oportunidade de novos negócios”, garante.
A TIM fornece infraestrutura de rede para MVNOs desde 2011, em todo o país. “Dados de março de 2021 estimam que 88% das empresas atuantes em MVNO utilizam a rede da TIM para prestação de serviços. Isso corresponde a 78% da base de todos os clientes de MVNOs do país, um tipo de negócio estratégico para nós”, afirma Gouvea.
Uma das MVNOs, a Fluke atua no modelo credenciada e oferece serviços digitais no varejo, focados em uma parcela de consumidores que buscam mais do que o mercado tem oferecido. Para o Marcos Oliveira Jr., CEO da empresa, há uma demanda muito grande por serviços mais personalizados, flexíveis e amigáveis e as MVNOs são o caminho para criar essas soluções. “A insatisfação dos clientes com as operadoras tradicionais é evidente. Para 68,6% dos brasileiros, os serviços de telefonia móvel não atendem às expectativas, segundo o INSC – Índice Nacional de Satisfação do Consumidor, e 46% cancelam ou trocam de operadora todos os anos”, avalia.
A percepção de Thiago Almeida, sócio-diretor da TGN – Tascom Global Network, grupo do qual faz parte a Use Telecom, é a mesma. “As quatro grandes operadoras de telefonia móvel são recordistas em reclamações e o MVNO vem com o propósito de melhorar esse cenário, criar células menores com atendimento direto ao cliente. Dessa forma, pequenos provedores conseguem fazer combos e atender a seus clientes de forma personalizada”, afirma.
Com foco nos provedores de Internet de pequeno e médio portes, a TGN atua no mercado de MVNO com aplicações específicas, especialmente para agregar valor a outros produtos. “A nossa base de ISPs atende mais de 6 mil clientes em todo o país e a expectativa é de que esse número chegue a 30 mil em 2022”, diz Almeida.
A Use Telecom é um ISP com mais de 2,8 mil km de rede de fibra óptica cobrindo mais de 80% das cidades dos estados da Bahia, além de Aracaju, SE, e região metropolitana. No ano passado, a empresa atualizou sua infraestrutura de fibra entre a Bahia e o Sergipe e se tornou uma empresa de rede neutra.
Sob medida
A estrutura mais enxuta é uma das vantagens das MVNOs em um mercado que tem a segmentação e a experiência do consumidor como uma das principais tendências. A agilidade e flexibilidade destas empresas ajudam a criar serviços na medida da necessidade. “Sem investimentos iniciais tão altos e sem preocupação com a infraestrutura, podemos colocar nossos melhores recursos no desenvolvimento de produtos e experiência”, avalia Oliveira Jr, da Fluke.
Ao utilizarem a infraestrutura tecnológica já instalada de grandes operadoras, as MVNOs já nascem dentro de um modelo de negócios vantajoso também em outros aspectos. Um deles, como avalia Araújo, da Claro, é estarem sujeitas à menor carga de obrigações regulatória, dependendo do modelo adotado e, ainda, reutilizar parte destas estruturas corporativas das grandes empresas, em áreas como jurídico, recursos humanos, vendas e atendimento, reduzindo seus custos, como é o caso dos provedores parceiros da TGN, que disponibiliza consultoria, jurídica, comercial e suporte. A empresa possui plataforma própria para operação com integração com grandes ORMs.
Essas características possibilitam às MVNOs prestarem um atendimento mais dedicado, próximo e assertivo ao cliente, que é onde as relações de consumo registram os maiores problemas. O modelo autorizado, estratégico para a TIM, como explica o diretor de soluções corporativas da empresa, proporciona maior agilidade e autonomia para desenvolvimento de planos e serviços para esses perfis de consumidores.
Essa é a estratégia da Fluke para crescer e as expectativas são bastante positivas: criar solução para demandas de públicos definidos em contrapartida às soluções genéricas e globais das operadoras convencionais. “Entender a dor de um grupo específico e suficientemente relevante de clientes é o primeiro passo”, acredita o CEO.
Para ele, se uma MVNO tenta terceirizar a maior parte do serviço é provável que falhe com os clientes e tenha dificuldades na retenção da base de clientes. No entanto, a satisfação do consumidor e as melhores experiências dependem das integrações técnicas ao atendimento.
Oportunidades e desafios
Potencial e crescente, o mercado de MVNOs é também desafiador e as exigências para a entrega de serviços abrangentes e de qualidade são proporcionais às possibilidades de negócios apresentadas pelo setor. “De um lado, elas garantem custos mais enxutos e ofertas atrativas que encantam e fidelizam clientes e, de outro, alinham a visão estratégica com empresas de grande público potencial aumentando o roll de competidores”, avalia o diretor da Claro, que acredita que, para alcançar o sucesso, o caminho, como MNO – Mobile Network Operator, é implementar processos simples, com comunicação eficaz, em uma esteira ágil e digital e sem concorrência com o core.
Com atuação em mais de 4.400 cidades, a TIM comercializa esse serviço no atacado. “Para ser uma MVNO, é importante que o provedor tenha um plano de negócios bem definido, com o objetivo de agregar valor ao seu core business. Do ponto de vista de investimento, para garantir agilidade e flexibilidade, é preciso contar com um core de rede próprio”, acredita o diretor da empresa, que considera como os principais desafios das companhias que atuam no modelo autorizado o nível de investimento destinado ao core de rede e a disponibilidade de recursos para abertura de filiais.
Em um país continental como o Brasil, os investimentos em infraestrutura são pesados e mesmo as grandes operadoras têm dificuldades na ampliação de sua presença, especialmente em nas regiões mais afastadas dos grandes centros ou em públicos com necessidades mais específicas, entre os quais se vislumbram mais oportunidades para as MVNOs, mas que também enfrentam as restrições causadas pela falta de cobertura das grandes operadoras em algumas regiões. Essa realidade pode ser mudada com a chegada do 5G, que abre caminho para um leque de serviços, principalmente, em regiões carentes de estrutura tecnológica.
Mais ágeis e flexíveis, essas empresas podem compor pacotes e serviços diferenciados que ‘falem’ diretamente a esses consumidores, mas precisam ter um entendimento muito claro desse mercado para identificar esses grupos. “O desafio para essa operação está em reorganizar o provedor de Internet para atender com qualidade a seus clientes e apresentar um atendimento diferenciado. Sem necessidade de investimentos em infraestrutura, as atenções se voltam apenas ao atendimento”, observa Almeida, da TGN.
Às grandes operadoras, como TIM e Claro, que já possuem presença nacional, o ponto chave está nos nichos e na forma como serão atendidos. “Investimos em setores do mercado e no desenvolvimento de ofertas para o mercado corporativo. A parceria com a Surf Connect, por exemplo, tem os Correios como maior cliente, e é a maior agregadora de MVNOs Human, com foco em clientes das classes C, D e E. A parceria com a Arqia, por outro lado, se destaca pelo foco M2M e IoT – Internet das coisas, com mais de 600 mil unidades de rastreamento”, conta Gouvea, da TIM.
Perspectivas positivas
Com uma imensa demanda a ser atendida, o mercado de MVNOs só tende a crescer, favorecendo consumidor, as próprias MVNOs e as operadoras de grande porte, considerando que empresas de diversos setores estão se abrindo a este tipo de operação. “Para 2022, o crescimento deve se manter e novas marcas devem investir neste negócio. Há grandes indícios que os setores varejista e financeiro são os mais cotados a assumir o protagonismo”, acredita Araújo, da Claro.
A Claro aposta neste pilar e conta com plataforma e uma equipe dedicada a este negócio, com condições técnicas e comerciais de acordo com o projeto e necessidade de cada parceiro.
Presente nas regiões Sul e Sudeste e parte do Nordeste, Centro-Oeste e Norte, a Fluke expande suas operações aos poucos, com base no número de pré-inscritos em cada novo Estado e a intenção é chegar a todo o Brasil até o fim do ano que vem. “Ainda somos uma marca nova, à medida que ganhamos escala e mais pessoas testam e comentam sobre nosso serviço geramos mais confiança para novos clientes”, avalia o CEO da companhia.
Atualmente, a Fluke dispõe de pacotes de 5 a 30GB com ligações ilimitadas, além da opção de montagem de pacotes customizados em múltiplos de 0,5 GB de internet e 30 minutos de ligação. Embora não ofereça serviços para provedores, a Fluke está aberta a parcerias com provedores que tenham interesse em recomendar seus serviços. “A maior parte dos provedores busca complementar o portfólio de ofertas com combos que incluam telefonia móvel, mas há dificuldades na integração de softwares que não são padronizados.”
Para a TIM, trata-se, também, de excelente oportunidade de novas parcerias de negócio e de ganho de escala no mercado corporativo. “Acreditamos que, no futuro, o MVNO faça diferença no mercado, tanto na oferta de pacotes personalizados quanto nos pacotes de valor”, afirma Gouvea.
A operadora disponibiliza a integralidade da “rede de acesso da TIM” em todo o território nacional e promete o melhor “time to market” para operações. “Acreditamos que nossas MVNOs são mais do que clientes, por isso estabelecemos uma relação de parceria. Somos um “case” de sucesso atuando neste segmento há mais de 10 anos, acumulando experiências e aprendizado que nos ajudam a ser eficientes e assertivos em novas negociações e implementações”, destaca o executivo da operadora.
Outro ponto observado por Almeida, da TGN, é que, quando um provedor de Internet atinge a totalidade de sua rede, ele precisa investir em infraestrutura para ampliar o mercado. No entanto, as MVNOs proporcionam o aumento do ticket médio ao oferecer novos serviços dentro e fora de sua base de clientes, sem a aplicação de recursos em infraestrutura.
Diante de um mercado que se mostra tão promissor, a concessão do 5G provocará a entrada de novas empresas que possuem espectro e infraestrutura, bem como maior oferta de atacado e mais possibilidades de negócios com MVNOs. “Muitos dos vencedores do leilão já deixaram claro o interesse na construção de redes neutras e/ou compartilhamento com MVNOs no futuro, o que deverá aumentar a disponibilidade e acesso à infraestrutura por essas empresas”, observa o CEO da Fluke.