Projeto de engenharia de rotas: Outside plant para FTTx
Celso Gonsales Saes, diretor da Sirius Tecnologia
Para conceituar, engenharia é a aplicação do conhecimento científico, econômico, social e prático com o intuito de inventar, desenhar, construir, manter e melhorar estruturas, máquinas, aparelhos, sistemas, materiais e processos.
Já matemática é a ciência do raciocínio lógico e abstrato, que estuda quantidades, medidas, espaços, estruturas, variações e estatísticas. Um trabalho matemático busca procurar por padrões, formular conjecturas e, por meio de deduções rigorosas a partir de axiomas e definições, estabelecer novos resultados.
Conceituados os termos, torna-se claro que para qualquer planejamento ou execução é preciso um raciocínio matemático. Quando tratamos de “engenharia de rotas” o processo mental não é diferente. Ele envolve a absorção de todas as variantes concretas que incidem sobre o objeto de estudo proposto e as abstrações e hipóteses que permeiam o nosso pensamento.
Projetar a engenharia de uma infraestrutura de rotas é uma atividade cujo resultado é fruto das variantes envolvidas, portanto, único. Embora estejam presentes elementos predefinidos e de parâmetros próprios, a dinâmica da engenharia está na composição dessas variantes.
A primeira tarefa para projetar uma rota física é a coleta de todas as informações referentes ao local onde será construída a infraestrutura. Independentemente da rota ser subterrânea, aérea, submarina ou híbrida, os parâmetros de estudo são os mesmos com pequenas variações e peculiaridades.
Apenas para elucidar a proposição das ideias apresentadas, vamos nos referir a um tipo de infraestrutura de rotas subterrânea. Quais são as informações e parâmetros de estudo envolvidos e que devem ser considerados?
A área é pública ou privada? Existem infraestruturas coabitando algum dos espaços? Se a área for pública, que tipos de restrições estão implícitas? Existirá compartilhamento de rotas? Quem tem as concessões e qual o custo para o compartilhamento?
Estas são apenas algumas das variantes naturais. Mas as análises não ficam restritas apenas às questões técnicas. Ampliando a visão, observamos variantes mais abrangentes: Qual é a situação geopolítica do local da infraestrutura? Existem conflitos sociais ou sindicais? Quais são as exigências de segurança no trabalho? Existem fatores legais ou religiosos referentes a horários de trabalho? Qual é o índice pluviométrico da região? Como são os acessos públicos ao local do canteiro de obras? E muito mais…
Ai vem a pergunta: O que essas variantes aleatórias têm a ver com engenharia de rotas?
Todo projeto tem, no mínimo, os componentes de planejamento de recursos, cronograma de compras, cronograma de execução, lista de materiais, planilha de custos, memorial descritivo e método construtivo. Todas essas variantes, além de outras, têm um impacto direto em cada uma das partes do projeto. Quer um exemplo?
“Supondo que as métricas do projeto apontem um cronograma de execução para a tarefa ‘abertura de vala em jardim’ para um trecho de 300 m, executado em três dias”.
Você não observou os períodos de chuva na região ou o índice pluviométrico. Então, seguindo o cronograma, a empreiteira foi mobilizada alocando os profissionais, máquinas, materiais, logística, etc.. Ao iniciar os trabalhos, chove torrencialmente.
Para onde vai o cronograma? Qual é a demanda de trabalho para reorganizar a tarefa? Para onde vão os custos?
Veja um exemplo do ponto de vista técnico:
“Supondo que, na situação anterior, sejam 20 m de vala em travessia pública por meio do método destrutivo. Toda documentação legal, alvarás dos órgãos públicos e logística para execução estão corretos. Vamos executar”.
Porém, o projetista não averiguou o tipo de tráfego da via pública para mensurar a carga de peso sobre o piso em relação ao coeficiente de compactação do solo e, com isso, ele definiu um envelopamento dos dutos inadequado para proteger a tubulação e os cabos lançados. Na via há tráfego de caminhões pesados.
E agora? Para-se tudo e as equipes são desmobilizadas e todas as métricas recalculadas. É preciso alterar as tarefas do cronograma, novos trâmites de compra de materiais, aprovações, renegociações. Somam-se ainda as perdas e prejuízos, sansões contratuais, desgaste de imagem, etc.
Para onde vai o cronograma? Para onde vão os custos? Sem falar das questões humanas envolvidas, como moral das equipes de trabalho, relações comercias entre as partes, credibilidade profissional e nível de satisfação.
Direcionando o foco da engenharia de rotas para o FTTx
Não por acaso, as peculiaridades das fibras ópticas trazem ao cenário da engenharia de rotas para FTTx outra gama de variantes que deve ser incluída no processo mental de criação que permeia o raciocínio do projetista. Embora a engenharia de rotas, de uma forma geral, tenha os seus padrões, normas e métricas, ela está submetida e vinculada aos padrões, normas e métricas de “para o que” a infraestrutura visa dar acesso, no caso “cabos e outros elementos ópticos”.
O estudo técnico é aplicado agora com foco nas características e métricas dos elementos da rota. Sabemos, por exemplo, que a fibra óptica é imune a interferências eletromagnéticas, porém a sua “kriptonita” é a umidade. O fato das moléculas da água causarem efeitos ópticos não lineares como o espalhamento, por exemplo, comprometem consideravelmente as atenuações do enlace, gerando perdas que inviabilizam a utilização do segmento e exigindo manutenção.
Assim, deveríamos projetar uma infraestrutura de dutos de policloreto de vinila, considerando o seu baixo custo para cabos ópticos?
O dutos de PVC e de CPVC são materiais desenvolvidos preferencialmente para conduzirem líquidos internamente, com tolerância às variações de temperatura ente 43℃ e 82℃ de pico entre os tipos. Sua composição é de 57% de cloro (sal marinho) e outros 43% de hidrocarbonetos do petróleo (eteno ou etileno). Quando este tipo de duto for enterrado, é saudável para o aproveitamento de sua vida útil que ele permaneça com água em seu interior. Se estiver seco por muito tempo, as variações de temperatura do solo e alguns outros fatores podem causar alguma corrosão e rachaduras, em especial no PVC, propiciando a entrada de umidade.
A pequena diferença de temperatura do cabo em contato com essa umidade penetrante pode condensar e gerar gotas de água no duto. Escorrendo para uma emenda ou conector, nascem os problemas. Use PEAD.
Sabemos que as rotas físicas são compostas de valas em jardim, calçadas e travessias. Além das valas onde são assentados os dutos, há outros elementos de engenharia civil utilizados nestas infraestruturas que são as caixas de passagem, de emenda, de conexão, galerias, etc.
Posso adquirir caixas comuns de medidas padrão no mercado? Posso construir as caixas de alvenaria? Como são os drenos e furos? Existem ferragens apropriadas? Quantos cabos irão atravessar a caixa? Que sobras serão armazenadas na caixa para cada cabo? Até que ponto, podemos aumentar a distância entre as caixas para economizar recursos?
A característica principal das fibras ópticas quanto ao seu manuseio é o índice de seu “raio de curvatura”. Excetuando as tecnologias atuais, que proporcionam raios de curvatura mínimos para determinadas aplicações, os cabos utilizados em rotas externas, outside plant, (normalmente fibras multimodo ou monomodo) possuem a indicação do mínimo raio de curvatura e quando não, assume-se por segurança que esse raio seja pelo menos de 15 x o diâmetro do cabo. Esse tipo de informação incide diretamente nas dimensões das caixas de passagem e emenda óptica voltadas para o FTTx.
A partir apenas destes detalhes apontados, as caixas de passagem devem:
1 – Obedecer às métricas de largura, comprimento e altura que permitam a fixação de degraus e suportes, em seu interior para o enrolamento das sobras, sem ultrapassar o raio de curvatura dos cabos de fibras ópticas, evitando os “micro/macro bends”, com altura suficiente para o acesso de pessoas e para acomodação de degraus e suportes distantes do base da caixa e do dreno.
2– Ser feitas de concreto armado para que não sofram assoreamento interno por ruptura de paredes de alvenaria. O berço da caixa de passagem/emenda deve obedecer às profundidades e às cotas de camadas de matérias que compõe o escoamento natural (areia, brita, etc.) para não acumular água de chuva em seu interior. As entradas e saídas de dutos precisam ainda estar mais altos na caixa.
3 – Em caso de caixas de emenda óptica, a largura deve ser superior as das caixas de passagem, por conta da instalação de FOSC – Fiber Optic Splice Closure e outros dispositivos de conexão de fibra nas laterais FT – Fiber Terminal), sem impedir o acesso de pessoas. A distância entre as caixas é calculada conforme a somatória dos feixes de cabos que serão lançados entre os vãos, respeitando as tensões de puxamento dos cabos, de acordo com o peso por metro quadrado. A tração e o puxamento dos cabos devem ser, preferencialmente, executados por máquinas e engates próprios – cerca de 90% das curvaturas em cabos de fibras ópticas ocorrem por conta de manuseio inadequado no momento de seu lançamento.
Conclusão
Chamo a atenção dos CEOs, gerentes, projetistas e instaladores para o aprimoramento de seus conhecimentos específicos do universo FTTx para obterem resultados melhores e mais racionais em seus projetos e desafios.
Todas as tecnologias que sinalizam o futuro das telecomunicações apontam para as redes ópticas passivas. Cidades inteligentes, 5G, indústria 4.0, IoT, holografia e muito mais.
É consultor sênior e iniciou a carreira na área de tecnologia com programação de sistemas e modelagem de dados em plataformas RISC e Intel. Especialista em cabeamento estruturado e networking, Saes trabalhou como professor nos cursos de Tecnologia da Informação no Centro Universitário Ibero-Americano. É perito judicial em tecnologia e informática, em diversos Fóruns em São Paulo. Atua desde 2004 em tecnologia de telecomunicações com redes ópticas passivas, com especialização em serviços FTTH e triple play. Criador do treinamento técnico FTTx-Clássico©, instrutor FTTx, consultor em soluções FTTx e serviços triple play.